quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

História cosmológica do boi - Poeta de Meia-Tigela


O poema formado por quatro sonetos,  "História cosmológica do boi", foi publicado no livro Memorial de Bárbara de Alencar e outros poemas (2008). O poema é constituído por quatro quadros que apresentam narrativas míticas e históricas sobre bois, que atravessaram eras e se entraram na pele e no coração das pessoas. São imagens poéticas que unem, no tempo e espaço, o arcaico e o pop, o folclórico e o religioso, o ocidente o o oriente, o nordeste e o estrangeiro, um rico dialogo de tradições.


HISTÓRIA COSMOLÓGICA DO BOI 

Para Rosemberg Cariry

O Boi quem não viu,
Não sabe o que é bom.
Melhor que bombril,
Melhor que bombom.

l. O BOI ORIGINAL

No princípio dos tempos, Arimã
Não dominava tudo com Seu Mal.
Mas logo procurou difundir Caos
Matando o Homem Perfeito e à Terra sã.

Esse malvado amigo de Satã
Deu fim mesmo no Boi Original.
Nem grão de açúcar nem pedra de sal,
Ninguém restou, adeus linda manhã.

Opa, aguardem que o Bem já se revolta
Prometendo estar em breve de volta,
Do Boi salvando os restos, o cadáver.

Donde nascerão belas Terras outras
E homens bonitos como Jão Travolta,
Mulheres maravilhas, Avas Gardners.



2. O BOI DE MITRAS

Coisa que se mistura e expande é Mito.
Deu que na Roma Antiga existiu Mitras,
Deus da luz e do sol que sacrifica
O Boi para que deste surja muita

Coisa que se misture e expanda, mirtos,
Flores, brotos, Vida em todo milímetro.
Eis que Hades sobe ao mundo com Ministros
E instaura a Dor em dose tripla, aos litros.

Mitras e Hades farão guerra entre sis
Mitras e Hades farão guerra entre sis
E há de ser catastrófico o conflito,
Antecipadamente apocalíptico.

Um Touro virá como jamais vi
Para dar fim ao Reino do Sinistro,
Assegurando a Paz: com Chifre e Cetro.


3. O BOIBUMBA

Todo o Universo cabe no Nordeste.
Se não fosse heresia, bem diria eu
Ser o Nordeste até maior que Deus
(Calo, pois temo qu'Este me moleste).

Também aqui o Boi, aquele Ancestre,
Avivou e depois desfaleceu.
Catirina pediu e o bom Mateo
O matou e trinchou. Ora, acontece

Que o dono protestou, fez escarcéu
Com razão (já que o Vitimo era seu).
A poder de orações, cantos e preces,

Bumba: a carne do Bicho revivesce
Virando o que era susto em grande festa.
Agora O relembramos sempre em êxtase.


4. O BOI MANSINHO

Estava me esquecendo de contar-lhes
O caso do Boi Santo, o Boi Mansinho
Mandado de presente ao meu Padinho
Ciço e cuja presença era de talhe

Tal, que José Lourenço pôs-se a dar-lhe
Atenção devotada e aos bocadinhos Foi-lhe
enfeitando os chifres, o focinho,
O lombo, os bagos, sem deixar detalhe

Do Zebu descoberto de bentinhos,
Mais parecendo um nobre de Versalhes:
Tanto que antes que o culto mais se espalhe

Floro Bartolomeu manda cortar-lhe
O corpo em pedacinhos, finos talhes —
Mas Ele encarna em cada bezerrinho...

Nenhum comentário:

Postar um comentário