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sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Poema de Demócrito Rocha

Rio Jaguaribe
  
O Rio Jaguaribe é uma artéria aberta  
por onde escorre  
e se perde 
o sangue do Ceará. 
O mar não se tinge de vermelho  
porque o sangue do Ceará  
é azul ... 

Todo plasma 
toda essa hemoglobina  
na sístole dos invernos  
vai perder-se no mar. 


Há milênios... desde que se rompeu a túnica  
das rochas na explosão dos cataclismos  
ou na erosão secular do calcário  
do gnaisse do quartzo da sílica natural ... 

E a ruptura dos aneurismas dos açudes... 
Quanto tempo perdido!

E o pobre doente — o Ceará — anemiado,  
esquelético, pedinte e desnutrido — 
a vasta rede capilar a queimar-se na soalheira — 
é o gigante com a artéria aberta  
resistindo e morrendo  
resistindo e morrendo  
resistindo e morrendo  
morrendo e resistindo... 

(Foi a espada de um Deus que te feriu 
a carótida 
a ti — Fênix do Brasil.) 

E o teu cérebro ainda pensa 
e o teu coração ainda pulsa 
e o teu pulmão ainda respira 
e o teu braço ainda constrói 
e o teu pé ainda emigra 
e ainda povoa. 

As células mirradas do Ceará  
quando o céu lhe dá a injeção de soro  
dos aguaceiros —  
as células mirradas do Ceará  
intumescem o protoplasma  
(como os seus capulhos de algodão) 
e nucleiam-se de verde 
— é a cromatina dos roçados no sertão... 

(Ah, se ele alcançasse um coágulo de rocha!) 

E o sangue a correr pela artéria do rio Jaguaribe...  
o sangue a correr  
mal que é chegado aos ventrículos das nascentes ... 
o sangue a correr e ninguém o estanca... 

Homens da pátria — ouvi:

— Salvai o Ceará! 

Quem é o presidente da República?

Depressa 
uma pinça hemostática em Orós! 

Homens — 
o Ceará está morrendo, está 
esvaindo-se em sangue ... 

Ninguém o escuta, ninguém o escuta  
e o gigante dobra a cabeça sobre o peito  
enorme, 
e o gigante curva os joelhos no pó  
da terra calcinada,  

— nos últimos arrancos — vai  
morrendo e resistindo  
morrendo e resistindo  
morrendo e resistindo 
  

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